terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

Primavera.

Ela olhou tristemente para o retrato do rapaz. Olhos claros, cabelos loiros. Ombros largos e sorriso acanhado. Richard, Richard.

- Filho da puta, por que foi embora?!

E atirou o retrato do outro lado da sala. Arrependeu-se, era sua única lembrança do namorado morto na guerra. Morrera como um herói, salvando todos do seu batalhão. Morrera torturado, morrera para não contar onde eles estavam. Dera a vida por seus companheiros. Herói de guerra.

A cena mais triste da vida dela. O caixão do seu amado, do seu herói, do seu soldado sendo carregado por seus companheiros, todos de preto. Alguém segurando sua mão durante o enterro. Todos de luto. Mas todos vivos. Deus, não era justo que ele morresse, não era! Eles iam casar, ter filhos, uma casa e um cachorro. Iam lavar o carro juntos, tomar vinho em frente à lareira e fazer amor em uma noite perfeita de inverno. Inverno, essa era a palavra para definir o coração da pobre menina naquele momento. Frio, insensível, duro. Inverno. Inferno. Interno. Sofrimento disfarçado com grosseria. Apenas amor.

Meses se passaram. Ela não conseguia ver como iria amar novamente. Ela sofria todos os dias. Ele prometera um mundo de felicidade pra ela, ele seria um marido perfeito. E a abandonara. O inverno permanecia no seu coração.

Dias depois do que seria o 29° aniversário dele, alguém batia à porta. Era um dos que haviam estado na guerra com Richard, seu nome era Remy. Alto, forte, olhos castanhos e cabelos da mesma cor. Barba por fazer e um sorriso acanhado, o mesmo sorriso de Richard. Viera entregar os pertences dele.

Naquele momento toda fúria e ódio e sofrimento vieram à tona. Ela queria bater naquele homem, ele era culpado, ele matou seu namorado, ele fizera a guerra, não importava. E quanto mais ela batia nele, mais ela se sentia melhor. Seu peitoral forte agüentava bem as pancadas fracas da mulher chorosa e desamparada. Quando ela finalmente parou, Remy simplesmente a abraçou. Ela retribuiu o abraço, e ele falou:

- Eu te entendo. Ele era meu melhor amigo, nunca me deixou desistir. Ele lutou como um herói e morreu como um herói. Chorar não vai trazê-lo de volta. Se acalme.

Sua voz grave era reconfortante. Seu perfume, inebriante. A segurança que ele passava era boa demais. Ela o conhecia, fora o homem que segurara sua mão durante o enterro de Richard.

Finalmente a primavera chegara para acabar com o inverno gelado no coração daquela pobre garota. O amor florescera mais uma vez.

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